Avançar para o conteúdo principal

Metamorfose



As crianças têm uma felicidade muito mais natural. Quando crescemos, a nossa felicidade deixa de ser ingénua e genuína e passa a ser pensada, construída, e muitas vezes falsa. Convencemo-nos que certas coisas nos fazem felizes. Enganamos o mais profundo do nosso ser e do nosso pensar, e nem descobrimos que o que nos faz realmente felizes e' aquela gargalhada súbita, que sai não sabemos bem como, não sabemos bem porquê. Estando bem entre amigos, como estando bem entre amores, sabemos que nada mais à volta interessa, mas isso era o que sentíamos muito mais frequentemente quando éramos crianças.

Eu imaginava que 'quando fosse grande' queria ter uma piscina exclusivamente cheia de leite creme. Teria empregados sempre a confirmar a temperatura e textura do leite creme, para que, quando me apetecesse, eu mergulhasse nesse éden gastronómico, em direcção a pirolitos de prazer. Ate' podiam ir amigos à piscina. Seria grande e dava para todos. No fim nem precisávamos de toalhas e podíamos tão simplesmente lamber os restos de leite creme das peles alheias como quem rapa o tacho do doce acabado de fazer. Aqui esta' logo uma das perdas de inocência. Não só não posso ter uma piscina de leite creme, como não posso dizer que lambia corpos alheios sem lhe dar um cunho de total desinocência.

Também queria que a minha cidade fosse toda equipada de escorregas de água. Sete colinas (são muitas mais, melhor ainda), transformadas num gigantesco parque aquático, da altura em que ainda ninguém os via como ferramentas de homicídio infantil. Eu então poderia andar pela cidade de calções e descer a Bica como quem ataca o Kamikaze.

Sabemos que tudo isto passa. Crescemos e percebemos que o mais próximo que a cidade se torna de um parque aquático gigantesco e' o dia em que chove desalmadamente, e na pressa (sempre a pressa) de chegar a lugar nenhum, derrapamos e quase levamos à letra a história do kamikaze.

Agora sei que não posso ter uma cidade de escorregas com água. Mas a piscina de leite creme...

Comentários

Mensagens populares deste blogue

À terceira é de vez!!!

Como tenho muita lata... este post é na linha de dois recentes... (um deles mesmo recentíssimo, o meu último) e trata da adaptação, não de séries (porque somos muito oranginais por estas bandas e isso depois na verdade tornar-se-ia repetitivo... quer dizer... até parece que assim não...), mas sim de filmes estrangeiros, para português. São novidades muito secretas e portanto só espero que tenham bastante cuidado na divulgação das mesmas (ao dizer isto espero que as publicitem, bem como a vinda aqui ao meu "little corner", numa jogada minha à laia d'"o fruto proibido é o mais desejado"). - Tó Pegane : história de um filho de uma ex-emigrante "na França" (daí a sempre típica mescla do nome António com o Pegane do francês com quem a senhora se casou). O rapaz entra para a Força Aérea, e depois há para lá umas intrigas. Ah! Na cena mais espectacular do filme, Tó Pegan faz um cozido à portuguesa, utilizando para aquecimento dos ingredientes a barriga...

pedras

acho muito simpático da parte do fernando guardar todas as pedras do caminho para um dia construir um castelo, mas aqueles de nós que as têm nos rins apreciavam outro tipo de eficácia diferente de apenas contemplá-las durante o passeio diário para abater barriga. com tanto heterónimo ao barulho, pasmo-me que o fernando, pessoa de bem, não tenha dado vida a um ente que se tornasse urologista e arranjasse maneira de ajudar a prevenir várias noites em posição fetal a namorar com o chão frio da casa de banho. diz o povo que as cólicas renais são piores que as dores de parto, mas o povo não pensa no facto de quase metade da população não poder atestar essa comparação. é provável que seja o povo feminino, e esse sim pode saber das duas, como sabe de tudo o resto, sempre em demasia, que o conhecimento verteu todo para o segundo cromossoma x. enquanto um brufen beija um ben-u-ron e abraça outro, vou continuar aqui no meu canto, meio revoltado com o fernando, enquanto pesquiso qual o valor da p...

na moda

Está na moda escrever sobre o amor. O truque é pintar o dito de lugares comuns e adornar o produto final com duas ou três asneiras das pesadas para emanar pseudo-rebeldia. O conjunto de palavras é tão bonito e tem uma força tão positiva que o que está mesmo a pedir é para ser posto num rectângulo, acompanhado de uma imagem do pôr-do-sol/paisagem verdejante/gatinhos/silhueta de um ou dois corpos (riscar o que não interessa) e feito, está pronto a sair do forno para esse sufrágio universal que são as redes sociais. Está na moda gostar dessa visão do amor. Que tenta copiar alguns traços dos mestres mas que os copia mal e porcamente, borra a tinta toda, mas encontra destinatários com a visão tão baça que nem dão por isso. Dantes havia o condão de ficar preso às letras do Shakespeare, do James, do Cummings e de tantos outros. Todos eles vieram por aí fora, ainda há bem pouco tempo dava para jogar à macaca com o Cortázar, mas está tudo a trocar a macaca por meia dúzia de macacos, que ap...