depois. há sempre um depois. temos de ir aqui, temos de jantar, temos de fazer isto, aquilo e mais não sei o quê.
o presente tem sempre o condão de soprar uma quantidade de tempo infinito, que permite tudo planear, sem data, sem certezas, porque a esperança média de vida vai decerto aumentar para oitocentos e trinta anos em breve, e depois de criopreservados seremos capazes de pôr a agenda toda em dia, mais década menos década.
o depois é mais escorregadio que a calçada do combro barrada de manteiga mimosa. um dia atravessa-se a porta do quarto, umas horas depois atravessa-se de novo mas na horizontal e com uma eternidade para fazer planos que não se vão cumprir, não assim tão diferentes dos que eram feitos quando as aurículas ainda batiam em compasso alternado com os ventrículos.
mais depois de amanhã, menos depois sem advérbio de tempo palpável, sem raízes concretas. a vida são dois dias, e de vez em quando troca-nos a volta e nem a um dia se lembra de chegar.
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