quem subiu à montanha mais alta? quem o conseguiu no menor tempo possível? quem o fez com as botas mais leves? qual o homem que foi até ao mais profundo que da terra se consegue alcançar? quem descobriu o caminho marítimo para a índia?
temos um vício maior em estabelecer metas do que algumas estrelas do rock em pó de cores claras.
a verdade é que dependemos do conforto de, pelo menos, saber para onde vamos. se o vasco da gama dissesse que ia só ao deus dará ninguém lhe financiava a viagem. se o joão garcia dissesse que queria subir até meio do evereste não havia cá bancos nem publicidades. o mesmo para tudo o resto. sem meta não há tanto lucro em fama.
por isso subimos. por isso descemos. por isso tentamos ir mais alto do que já se foi e mais fundo do que alguém alguma vez possa ter imaginado. cilindramos o tempo na tentativa do mais, do maior, do que está para lá do que há e não paramos nem microsegundos para apreciar o que está entre o ponto de arranque e a meta.
depois, por momentos, sentamo-nos à beira de um rio. impregnamo-nos do barulho do silêncio. olhamos os peixes, tentamos perceber quão caótico é o seu ordenado circuito ou quão ordenado é o seu caótico circuito. vimos os pássaros saltitar entre pedras, deitar a cabeça de lado e olhar para nós com o habitual olhar inquisitivo com que quem voa olha para quem não o sabe fazer. o pássaro provavelmente pergunta-se como é que um tipo com ar de quem tudo acha que sabe não consegue sequer descolar os pés do chão mais do que uns segundos. ri-se ironicamente do mesmo tipo por nem sequer se maravilhar a cada momento com o que o avanço do seu pensamento permitiu, já que voa naqueles pássaros de ferro com a naturalidade com que bebe água ou se alimenta, e jamais vangloria a liberdade de o conseguir fazer. no meio deste riso irónico, flecte as pernas, contrai todas as fibras musculares do seu corpo de ave e levanta vôo, lançando-se em Zs que se cruzam com Ss e que parecem tudo menos preocupados com a meta.
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