Avançar para o conteúdo principal

sei que o tempo pára exactamente naquele momento em que a pestana se imobiliza



há um momento em que tenho a certeza que o tempo pára.


são micro-segundos. o tempo em que olho fixamente para dentro dos teus olhos. seria mais fácil achar que o olhar ficava preso na cor, nos milhões de cristais roubados ao arco-íris, que escondem habilmente os segredos guardados lá dentro na alma. mas não, fica preso no instante em que a pestana superior pára de subir e se imobiliza, antes de descer novamente. é o momento em que tudo cede.


quando a pestana resolve mudar de direcção, todo o mundo se suspende num maravilhoso golpe de rins. o rímel sente a vertigem de quem anda numa montanha-russa e deixa-se ir no doce contorno da descida que vai levar a uns olhos fechados.


o perfume intenso das emoções espalha-se em pequenas borrifadelas. são puffs de paixão, disfarçados com cosméticos ou artifícios, mas que denunciam o criminoso em flagrante delírio. são borboletas-no-estômago-like. são dragões chineses, daqueles a brincar, a encher as ruas de uma cidade diferente, uma cidade sem nome, em que os cidadãos não têm duas pernas ou dois braços, mas sim um corpo diferente, de estrutura complexa e não de fisicalidade simples.


é por isso que sei que o tempo pára nesse momento. quando a tua pestana desce, ouvimos o barulho dos carris debaixo dos nossos pés. o horizonte torna-se repentinamente vertical e desorizontalizado e mergulhamos no vórtex da descida, fazendo muita força para agarrar o corpo à carruagem.


quem vê de fora, acha que temos medo de cair. mas eu sei que a força é para que a viagem nunca tenha fim.


Comentários

Mensagens populares deste blogue

À terceira é de vez!!!

Como tenho muita lata... este post é na linha de dois recentes... (um deles mesmo recentíssimo, o meu último) e trata da adaptação, não de séries (porque somos muito oranginais por estas bandas e isso depois na verdade tornar-se-ia repetitivo... quer dizer... até parece que assim não...), mas sim de filmes estrangeiros, para português. São novidades muito secretas e portanto só espero que tenham bastante cuidado na divulgação das mesmas (ao dizer isto espero que as publicitem, bem como a vinda aqui ao meu "little corner", numa jogada minha à laia d'"o fruto proibido é o mais desejado"). - Tó Pegane : história de um filho de uma ex-emigrante "na França" (daí a sempre típica mescla do nome António com o Pegane do francês com quem a senhora se casou). O rapaz entra para a Força Aérea, e depois há para lá umas intrigas. Ah! Na cena mais espectacular do filme, Tó Pegan faz um cozido à portuguesa, utilizando para aquecimento dos ingredientes a barriga...

na moda

Está na moda escrever sobre o amor. O truque é pintar o dito de lugares comuns e adornar o produto final com duas ou três asneiras das pesadas para emanar pseudo-rebeldia. O conjunto de palavras é tão bonito e tem uma força tão positiva que o que está mesmo a pedir é para ser posto num rectângulo, acompanhado de uma imagem do pôr-do-sol/paisagem verdejante/gatinhos/silhueta de um ou dois corpos (riscar o que não interessa) e feito, está pronto a sair do forno para esse sufrágio universal que são as redes sociais. Está na moda gostar dessa visão do amor. Que tenta copiar alguns traços dos mestres mas que os copia mal e porcamente, borra a tinta toda, mas encontra destinatários com a visão tão baça que nem dão por isso. Dantes havia o condão de ficar preso às letras do Shakespeare, do James, do Cummings e de tantos outros. Todos eles vieram por aí fora, ainda há bem pouco tempo dava para jogar à macaca com o Cortázar, mas está tudo a trocar a macaca por meia dúzia de macacos, que ap...

Sliding Doors

Assim que abriu a porta sentiu o cheiro do perfume dela. As moléculas atravessavam todos os recantos da sala, saltavam do pescoço dela, atravessavam as partículas feitas do mesmo pó que as estrelas, para se irem alojar nos sensores olfactivos do seu nariz, refinados durante anos para saber distinguir o agradável do nauseabundo, bem como tudo o que está pelo caminho. Os cabelos dela brilhavam como se tivessem sido tocados pelo Rei Midas. Deslizavam pelas costas, lembrando-lhe a cor com que fica a encosta inclinada de uma montanha naquele lusco-fusco que se precipita ao pôr do sol. O nariz dela tinha as proporções perfeitas de uma rainha do século XVIII e era empinado o suficiente para lhe dar o ar de quem sabe por onde vai. Os seus olhos estavam, com certeza, nos lugares cimeiros da lista dos olhos mais bonitos do mundo. Tinham tanta vida, pensou ele, eram da cor que resultaria do acasalamento do azul turquesa com aquele verde dos lagos da Croácia. ...