já dizia o fantástico louis armstrong que " when you're smiling the whole world smiles with you ".
os meus domingos de manhã ultimamente têm esta melodia a correr-me nas veias. mudei-me para cleveland há quase dois meses. apesar do meu frequente contacto rural e nomadismo, sempre fui um menino da grande cidade, um morador em capitais, um perfeito urbano, viciado nos vícios do urbanismo e feito de sopros que se confundem ao mesmo tempo com rios, castelos, betão, azulejos ou ferro. sempre habituado ao fervor de uma cidade com programação interminável, perguntava-me como iria ser adaptar-me a um mundo totalmente novo e diferente. sobretudo num país que nós, europeus, vemos com tanta desconfiança, por motivos históricos recentes e pela nossa competitividade natural.
cleveland é uma cidade, no geral, vítima de decadência. as únicas excepções são o galopante polo científico e universitário, de qualidade mundial e em crescimento, motivo pelo qual aqui vim parar. praticamente tudo o resto foi vítima de queda. a cidade tinha há quinze anos atrás um milhão e duzentos mil habitantes, tendo hoje em dia pouco mais de quatrocentos mil. foi-se o dinheiro. caiu a indústria. caiu o ferro, o aço, até o le bron james se foi embora e abandonou a equipa dos cavaliers. porque provavelmente há quem não saiba, uma grande parte dos magnatas americanos saiu desta cidade. exemplo crasso j.d.rockfeller, que construiu todo o seu gigantesco império do zero, nascendo e vivendo em cleveland, antes de rumar em força para nova iorque.
a breve explicação da decadência leva-me ao título deste texto. os meus domingos de manhã são passados a andar de bicicleta pelos subúrbios desta minha nova cidade. e a cada dia me maravilho de novo com o arco-íris que cada uma destas pessoas coloca nas nuvens que possam existir. a população nos suburbios é quase a cem por cento de raça negra, o que faz de mim, um claro outsider neste cenário. passo por famílias inteiras, vestidas de modo aprumado, os homens de fatos de cor garrida e as senhoras com vestidos sulistas, todos impecavelmente encaminhando-se para a missa semanal. credos aparte, estas pessoas vão numa perfeita harmonia, alheios à crise, alheios ao desemprego, alheios à desistência da luta. o mais espectacular de tudo é que não há um que dispense acenar-me, dizer-me 'bom dia', mas sobretudo sorrir-me.
re-encontrei nesta terra o valor do sorriso. achava que o natural era vivermos as nossas vidas como sempre a vivi. ir avenida abaixo a pensar em quantos milhares de euros vou gastar em coisas que não me fazem rigorosamente falta nenhuma. se olhar para alguém e sorrir na baixa de lisboa, passo por maluco ou por atrevido. aqui todos se consideram família. as pessoas são genuinamente simpáticas, e o meu filtro, que como tudo na vida pode falhar, faz-me acreditar que são genuinamente boas.
maravilho-me com este paradoxo, na terra onde supostamente imaginamos gente arrogante e sem apreço pelo mundo ou pela vida alheia. a minha nova paixão é essa: trocar sorrisos ao domingo de manhã, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
(texto escrito em Junho de 2011)
os meus domingos de manhã ultimamente têm esta melodia a correr-me nas veias. mudei-me para cleveland há quase dois meses. apesar do meu frequente contacto rural e nomadismo, sempre fui um menino da grande cidade, um morador em capitais, um perfeito urbano, viciado nos vícios do urbanismo e feito de sopros que se confundem ao mesmo tempo com rios, castelos, betão, azulejos ou ferro. sempre habituado ao fervor de uma cidade com programação interminável, perguntava-me como iria ser adaptar-me a um mundo totalmente novo e diferente. sobretudo num país que nós, europeus, vemos com tanta desconfiança, por motivos históricos recentes e pela nossa competitividade natural.
cleveland é uma cidade, no geral, vítima de decadência. as únicas excepções são o galopante polo científico e universitário, de qualidade mundial e em crescimento, motivo pelo qual aqui vim parar. praticamente tudo o resto foi vítima de queda. a cidade tinha há quinze anos atrás um milhão e duzentos mil habitantes, tendo hoje em dia pouco mais de quatrocentos mil. foi-se o dinheiro. caiu a indústria. caiu o ferro, o aço, até o le bron james se foi embora e abandonou a equipa dos cavaliers. porque provavelmente há quem não saiba, uma grande parte dos magnatas americanos saiu desta cidade. exemplo crasso j.d.rockfeller, que construiu todo o seu gigantesco império do zero, nascendo e vivendo em cleveland, antes de rumar em força para nova iorque.
a breve explicação da decadência leva-me ao título deste texto. os meus domingos de manhã são passados a andar de bicicleta pelos subúrbios desta minha nova cidade. e a cada dia me maravilho de novo com o arco-íris que cada uma destas pessoas coloca nas nuvens que possam existir. a população nos suburbios é quase a cem por cento de raça negra, o que faz de mim, um claro outsider neste cenário. passo por famílias inteiras, vestidas de modo aprumado, os homens de fatos de cor garrida e as senhoras com vestidos sulistas, todos impecavelmente encaminhando-se para a missa semanal. credos aparte, estas pessoas vão numa perfeita harmonia, alheios à crise, alheios ao desemprego, alheios à desistência da luta. o mais espectacular de tudo é que não há um que dispense acenar-me, dizer-me 'bom dia', mas sobretudo sorrir-me.
re-encontrei nesta terra o valor do sorriso. achava que o natural era vivermos as nossas vidas como sempre a vivi. ir avenida abaixo a pensar em quantos milhares de euros vou gastar em coisas que não me fazem rigorosamente falta nenhuma. se olhar para alguém e sorrir na baixa de lisboa, passo por maluco ou por atrevido. aqui todos se consideram família. as pessoas são genuinamente simpáticas, e o meu filtro, que como tudo na vida pode falhar, faz-me acreditar que são genuinamente boas.
maravilho-me com este paradoxo, na terra onde supostamente imaginamos gente arrogante e sem apreço pelo mundo ou pela vida alheia. a minha nova paixão é essa: trocar sorrisos ao domingo de manhã, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
(texto escrito em Junho de 2011)
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