Avançar para o conteúdo principal

transparências

o mundo é um lugar em constante mudança. desde a primeira hora, do primeiro minuto e do primeiro segundo. é essa aliás a essência da sua criação. se as moléculas tivessem permanecido estáveis, de mão dada a olhar para a lua ou a apanhar sol numa esplanada, jamais teriam entrado em choque e dado origem, por exemplo, à vida.

não sei se na origem do mundo existiam esplanadas. mas não tem grande importância para o caso. o que importa é que a rebelião entre elas degenerou numa bela sopa e a pouco e pouco tudo se foi orientando na direcção do que hoje somos e daquilo em que nos tornámos.

das coisas mais apaixonantes das descobertas científicas modernas (o dicionário não reconhece apaixonante como uma palavra válida, alguém lhe dê um beijo bem dado) é perceber que a mudança até se consegue ir cunhando à medida que o próprio indivíduo avança, e que determinadas características que conferem vantagem selectiva são passadas à geração seguinte, algo que até há poucos anos se julgava impossível. somos, assim, não meros espectadores do mergulho aleatório do nosso código genético, mas actores, com papéis mais principais ou mais secundários conforme a cena.

por entre maravilhosas descobertas, vamos paralelamente inventando formas de compensar o livre arbítrio dos genes com o demasiado apertado controlo das almas. cada vez somos mais visíveis, a cada esquina, a cada mesa de restaurante, a cada escadaria perdida cidade fora. deixámos a beleza do anonimato e da privacidade num qualquer espaço e tempo perdido e damo-nos ao mundo sem sequer questionar o que recebemos em troca. damos oxigénio para receber bytes. damos pixels para receber likes. damos a alma e o corpo e ainda um pouco mais e deixamos de nos saber centrar. num só eixo. num adequado casulo.

tempo. é tudo uma questão de tempo. chegará o dia em que as paredes de todas as nossas casas, de todos os nossos edifícios, não serão nada mais do que transparentes. e ter uma caixa à prova de tudo, à prova de olhares, à prova do mundo, será um luxo tão grande que nem sei sequer se será possível de encontrar. 

Comentários

José Costa disse…
Mais que um luxo, será ilegal! Dirão até que seria venenoso estar num local onde não se pode ser visto.

Mensagens populares deste blogue

À terceira é de vez!!!

Como tenho muita lata... este post é na linha de dois recentes... (um deles mesmo recentíssimo, o meu último) e trata da adaptação, não de séries (porque somos muito oranginais por estas bandas e isso depois na verdade tornar-se-ia repetitivo... quer dizer... até parece que assim não...), mas sim de filmes estrangeiros, para português. São novidades muito secretas e portanto só espero que tenham bastante cuidado na divulgação das mesmas (ao dizer isto espero que as publicitem, bem como a vinda aqui ao meu "little corner", numa jogada minha à laia d'"o fruto proibido é o mais desejado"). - Tó Pegane : história de um filho de uma ex-emigrante "na França" (daí a sempre típica mescla do nome António com o Pegane do francês com quem a senhora se casou). O rapaz entra para a Força Aérea, e depois há para lá umas intrigas. Ah! Na cena mais espectacular do filme, Tó Pegan faz um cozido à portuguesa, utilizando para aquecimento dos ingredientes a barriga...

pedras

acho muito simpático da parte do fernando guardar todas as pedras do caminho para um dia construir um castelo, mas aqueles de nós que as têm nos rins apreciavam outro tipo de eficácia diferente de apenas contemplá-las durante o passeio diário para abater barriga. com tanto heterónimo ao barulho, pasmo-me que o fernando, pessoa de bem, não tenha dado vida a um ente que se tornasse urologista e arranjasse maneira de ajudar a prevenir várias noites em posição fetal a namorar com o chão frio da casa de banho. diz o povo que as cólicas renais são piores que as dores de parto, mas o povo não pensa no facto de quase metade da população não poder atestar essa comparação. é provável que seja o povo feminino, e esse sim pode saber das duas, como sabe de tudo o resto, sempre em demasia, que o conhecimento verteu todo para o segundo cromossoma x. enquanto um brufen beija um ben-u-ron e abraça outro, vou continuar aqui no meu canto, meio revoltado com o fernando, enquanto pesquiso qual o valor da p...

quando me falta o ar

sei que ainda não sabes, porque ainda não tens idade para saber, mas há mais de trinta anos que me questiono sobre o que é a felicidade e como encontrar o mapa para lá chegar . procurei nos bancos de jardim, nos bancos da faculdade, desde casa até ao outro lado do mundo, de polo a polo, e nunca encontrei quem a conseguisse definir para mim nem quem soubesse que travessas tens de cruzar para dar de caras com o tal mapa .  sempre me pareceu que provavelmente a vais encontrar nas pequenas coisas, mais do que nas grandes . vais deparar com um mundo em que cada vez menos se liga ao que quer que seja e que se acha que ter é ser, que ter é saber, ignorando que um sorriso vale mais que estofos de pele e mãos entrelaçadas ao pôr-do-sol batem um relógio que reage ao toque e fala contigo .  soube finalmente há vinte e seis dias o que é a verdadeira felicidade e sei desde há vinte seis dias o que é verdadeiramente o medo . nunca pensei ir descobrir o que eram ambos quase ao mesmo te...