Todos os anos, em Agosto, vejo cirandar uma carrinha do circo pelas ruas da outrora pacata vila alentejana onde passo férias. Uma voz gravada e ampliada pelo altifalante anuncia, entre outras diversões, simpáticos porquinhos e ursos do Cánadá (assim mesmo, com dois acentos, para parecer que o senhor que gravou a cassete é também ele estrangeiro, talvez pertencente ao circo do Mónaco). O espectáculo reúne centenas de pessoas e, no ano seguinte, certo de outro sucesso, regressa à vila com renovado vigor.
O circo perturba-me. Os porquinhos até podem ser simpáticos e não discuto a origem dos ursos mas há imagens que me impressionam. Meia dúzia de leões tristes enclausurados numa jaula pequena; macacos sem árvores para trepar; cãezinhos vestidos de bailarinas ou com o equipamento de clubes de futebol. E não só animais ... É o ilusionista que troca de roupa no intervalo e se transforma no atirador de facas; a assistente do ilusionista que tem quase sempre mais de 50 anos e ainda acumula as funções de trapezista com collants esburacados e de vendedora de amendoins; o palhaço pobre e o palhaço rico, ambos com piadas paupérrimas.
Sentada na plateia, contemplo com desagrado as exibições dos supostos artistas e os truques contrariados dos animais. Acho que estou sozinha na minha reprovação. Em volta, todos se riem eufóricos e abanam a cabeça ao som de músicas populares, enquanto os palhaços, agora convertidos em mercadores, lhes impingem canudos coloridos de plástico que se iluminam na escuridão da tenda.
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