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ensaio sobre o mutismo

um clube para o silêncio. a ideia tinha de sair da cabeça do mestre david, não o beckham nem o rei de outras eras, apenas aquele que pega num rolo de película e dá novos mundos ao mundo, desertando do convencional e do terreno palpável e seguro.

dizia ele que o truque do silêncio numa música é não haver banda. tragam a voz, e podemos nós próprios sentir o som de qualquer instrumento. ouvi-lo em surdina, cheirá-lo em tons elevados, devorá-lo em compassos incertos.

será o mesmo com as palavras não cantadas?

como seria um mundo em que ninguém conseguisse falar? não preciso de perguntar o mesmo em relação a um onde ninguém conseguisse ouvir, porque essa é um pouco a história da nossa actualidade. mas, e um mundo do silêncio puro da emissão?

sem esdrúxulas, graves ou agudas. sem ditongos. zero onomatopeias. ausência de ditados. sons deitados para sempre. mutismo completo. seria a escrita suficiente? seria um papel à nossa frente a forma ideal de deitar cá para fora as vontades, ansiedades, liberdades e todas as outras ades?

por mais valor que dê à escrita, a visão não chega. o tacto ajuda, mas o som é uma espécie de reino do butão no mundo das sensações. as palavras podem ser maravilhosas, mas a forma como são ditas tem uma grande quota parte no pormaior que leva ao desarme. é o que faz cair da cadeira. é o que se enrola nos cabelos e os prende para o pescoço na direcção de um beijo que é quase magneticamente garantido na confiança das palavras.

não haver banda pode servir para um excerto do lynch. mas na minha cabeça o som funciona como uma espécie de ave de rapina. paira horas a fio no seu vôo. raramente pára. quando pára é para descer vertiginosamente. por segundos. que parecem por vezes horas. mas são cúmplices com a explosão de palavras ao invés de casados com o mutismo.

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